domingo, 16 de agosto de 2009

Influência indígena na formação das famílias tradicionais do Seridó

O povoamento do Seridó teve o seu inicio no ano de 1670. Poucos anos decorridos da implantação dos primeiros currais de gado na região, eclodiu o chamado Levante do Gentio Tapuia ou Guerra dos Bárbaros. Esse conflito levou às terras seridoenses, milhares de combatentes empenhados na luta ao tapuia levantado. Indígenas e negros obedecendo ao comando de oficiais brancos obviamente.

Ocorreu uma intensa miscigenação entre os componentes do partido português e as índias Tapuias, Janduís, Canindés e Pegas ou Ariús. Tais tribos, eram aqueles mesmos Tarairiús descritos pelos cronistas flamengos, que se ocuparam da descrição do período da ocupação Holandesa. Segundo as descrições feitas por aqueles cronistas, que privaram com os Tapuias, as mulheres dessas tribos eram de estatura inferior aos varões da mesma raça, gordas e “muito bonitas de cara”. Ademais, eram muito obedientes e serviçais aos seus maridos.

Como é óbvio, à falta de mulheres ditas “civilizadas”, as mulheres tapuias serviam, perfeitamente, para fazer companhia àqueles combatentes do partido português. Todas as famílias tradicionais do Seridó ainda conservam lendas, já muito diluídas pelo tempo, narrando a ocorrência de terem aquelas famílias, entre as suas ancestrais, algumas índias “pegadas a laço”, depois de terem sido perseguidas pelos vaqueiros, a cavalo, sendo algumas delas “pegadas a dente de cachorro”. Geralmente, segundo tais lendas, os vaqueiros se deparavam, um belo dia, com rastros deixados por pés femininos, daí se seguindo a perseguição, que culminava com o aprisionamento da pobre índia, quase sempre refugiada nos altos das serranias.

A tradição oral da região do Acarí e Carnaúba dos Dantas conta haver sido aprisionada, pelos vaqueiros de Caetano Dantas Corrêa, uma dessas índias, ainda adolescente e muito feroz. Capturada, foi posta no tronco, para amansar, tal qual se fazia com os barbatões pegos no mato! Após amansada, aquela índia foi batizada com o nome de Micaela, tornando-se, com o passar do tempo, uma espécie de governanta da casa de seu amo. Inclusive, segundo a lenda, Micaela veio a ter filhos de um descendente do próprio Caetano.

Somente depois de 1720 ocorreu a chegada de mulheres brancas ao Seridó. Já havia cessado o perigo dos levantes tapuias. Muitos dos veteranos combatentes do período da guerra permaneceram no Seridó, acompanhados de suas companheiras tapuias, já cercados de filhos. Tais posseiros requereram datas e sesmarias nas terras seridoenses, ali ficando para o resto de suas vidas.

A tradição aponta ainda, a existência de Custódia de Amorim Valcácer, casada com o português Pedro Ferreira das Neves, por volta de 1690, e que, junto ao marido, foram os troncos genealógicos, de quase todas as famílias tradicionais do Seridó. Custódia foi a indígena mais citada, nos estudos sobre a formação das famílias, de toda a região.

Cita-se também a pessoa de certa índia, companheira de Manoel Vaz Varejão, veterano da guerra dos Bárbaros, sesmeiro nas Piranhas e nas Espinharas; tendo sido, esse casal, os avós maternos de Caetano Dantas Correa e de José Dantas Corrêa, de quem descendem os Dantas do Seridó e do Teixeira, respectivamente.

Houve uma outra indígena, companheira do padre Daniel Gomes Alarcón, que deu origem a numerosa família seridoense. Outro sesmeiro, Tomás Diniz da Penha, igualmente “encostou-se” a uma índia, com imensa descendência pelo sertão seridoense.

Infelizmente, a documentação eclesiástica daquela época, tanto vinculada à Freguesia de Nossa Senhora do Bom Sucesso do Piancó (Pombal) como à Freguesia da Gloriosa Santana do Seridó (Caicó), desapareceu, ou foi consumida pelo tempo. No Caicó, somente sobrevive a documentação posterior a 1788, abrangendo, portanto, um período cronológico posterior àqueles em que ocorreram os casamentos, batizados e óbitos de muitos dos descendentes daqueles Tapuias.

Por volta de 1820 desapareceram, nos registros caicoenses, as referencias a indivíduos indígenas, ainda como tais considerados. Mas, tudo gente pobre, sem quaisquer relacionamentos com as famílias tradicionais.

Um detalhe me ia escapando: Aqueles primeiros sesmeiros do Seridó, muitos deles remanescentes da campanha bélica contra os tapuias, e cujas filhas eram produto do cruzamento do branco com a índia, sempre procuravam casar seus rebentos, com rapazes portugueses. Estes, chegados pobres ao Brasil, eram convidados pelos patriarcas do Seridó a se casarem com suas filhas, recebendo tais portugueses um compensador dote matrimonial. Os portugueses vindos, pelo século XVIII para o Seridó, eram, na sua maioria, oriundos dos Açores e do Norte de Portugal.

Nos livros mais antigos do Seridó, ainda encontram-se referências a muitos desses reinóis. Todos os velhos cronistas, desde o período da ocupação neerlandesa, sempre exaltaram a beleza das mulheres mamelucas. Aliás, essas mulheres sempre foram as escolhidas para fins matrimoniais. Os primeiros povoadores do Seridó souberam acolher, da cultura indígena, tudo aquilo que de proveitoso contivesse, o que facilitou a adaptação daqueles desbravadores às difíceis condições ambientais do sertão.

2 comentários:

  1. Procurei e achei. Cara, eu gostei do texto sobre as índias pegas no laço.

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  2. Eu gostei de conhecer melhor essa história que falam sobre as índias.

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