sábado, 1 de agosto de 2009

Tavares de Lyra e a educação nacional


Em junho de 1906, o presidente eleito Afonso Pena que governou o país de 15 de novembro de 1906 a 14 de julho de 1909, quando de seu falecimento, empreendeu visita aos estados do Nordeste. Logo na chegada a Natal, foi saudado pelo governador Augusto Tavares de Lyra com um discurso que saiu dos moldes da louvação para apontar uma realidade dura:
[...] ao espírito clarividente de V. Exª. não escaparão, por certo, as causas do atraso e pobreza em que vivemos. O nosso problema por excelência é como o de todos os Estados, o problema econômico, cuja solução mais difícil se torna pela inconstância das estações, pelas crises climáticas periódicas que nos tortura e flagelam. Sujeita a oscilações e alternativas de toda ordem, nossa situação é embaraçosa e delicada. (LACOMBE, 1986, pág. 332).

Impressionado com o discurso de Tavares de Lyra, o presidente Afonso Pena convidou-o para dirigir a pasta da Justiça e Negócios Interiores. Julgando-se inexperiente para o cargo, o governador quis declinar do convite, passando então a se comunicar, por telegramas, com o senador Pedro Velho, que se encontrava no Rio de Janeiro:

Não tenho prestigio próprio, não disponho confiança pessoal Presidente, de quem nunca tive aproximações qualquer ordem. Nestas condições não terei força bastante resistir amigos, sem cujo apoio não poderei manter-me. Receio minha demora pasta seja pequena. [...] não poderei desempenhar cargo condignamente. Sabe bem vou despertar inveja, ciúmes, precisando duplicar esforços. Reflita bem. Se me dá liberdade agir, recuso terminantemente. (LYRA, 1910, pág. 38).

O senador Pedro Velho respondeu advertindo o quanto seria “desairosa” ao presidente, a recusa de Tavares de Lyra, ao mesmo tempo que pedia para que esperasse sua chegada ao Estado para uma resposta. Adiantava que a indicação do seu nome para ministro partiu de Belo Horizonte sem nenhuma ação dele.

Advertia ainda que, uma recusa poderia tornar o Partido Republicano do Rio Grande do Norte de “esquerda” e “Querendo deixar depois por cansaço ou aborrecimento não faltarão hábeis, aceitáveis motivos. Irás então Senado ou voltarás governo”. (LYRA, 1910, pág. 38).
Após o dialogo (por telegrama) com Pedro Velho, Tavares de Lyra aceitou o cargo. Constituiu entre os pares, o que os antigos políticos denominaram de Jardim da Infância, uma reunião de jovens políticos que apoiavam administrativamente o Presidente Afonso Pena.

Na Capital política, econômica e cultural do país “diferentes visões de mundo conviviam e fundiam-se no mesmo espaço social, compondo a sinfonia da cidade e redefinindo os padrões de comportamento” (MORAIS, 2002, pág. 33). Dentro deste ambiente a rotina governamental é descrita por Tavares de Lyra, historiando essa fase da vida republicana em conferência no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB). Anos depois, relembrando o governo de Afonso Pena, Tavares de Lyra afirmava que “Administrativamente, sua presidência foi um período de labor fecundo para a solução imediata ou oportuna de problemas fundamentais do país”. (LYRA, 1939, pág. 907).

Sobre sua passagem pelo ministério da Justiça e Negócios Interiores, Tavares de Lyra apontou:
[...] neste ministério, como nos outros cargos de administração que tenho exercido, os meus processos de moderação, que não exclui a firmeza, foram sempre os mesmos a que obedeceu a minha orientação política. Ninguém pode inverter o seu feitio. Bons ou maus esses processos? As vossas homenagens traduzem para mim a certeza de que não os condenais, reconhecendo, pelo contrario, que – honestos em seus intuitos e eficazes em seus efeitos – eles contribuíram um pouco para a realização da obra empreendida pelo atual governo. (LYRA, 1918, pág. 21).

Durante o tempo em que permaneceu a frente da pasta da Justiça e Negócios Interiores, tendo por base os seus relatórios ministeriais, observamos que Tavares de Lyra teve a oportunidade de reorganizar muitas instituições importantes para a consolidação da República, mas, segundo o próprio testemunho que emana de suas memórias,“[...] a todos, porém, sobrelevava a reforma do ensino público” (LYRA, 1943a, pág. 06). Problema que preocupava desde os tempos de educador, ainda em sua terra, e que observamos em documentos oficiais, especialmente em circunstanciada exposição de motivos (ANEXO A), que, encaminhada por mensagem presidencial, foi presente ao Congresso Nacional em junho de 1907.

Na exposição concretizou, justificando as bases sobre as quais, a seu entender, deveria repousar a referida reforma:

Quanto ao ensino primário: fundação de escolas nas colônias civis e militares e nos territórios federais; subvenção a escolas fundadas por particulares e associações; auxílios às municipalidades e governos estaduais, mediante acordos, nos termos e pela forma que indicava; ensino gratuito; programas uniformes oficialmente aprovados; compromisso por parte dos Estados de manterem as escolas subvencionadas logo que cessasse o auxílio da União e de não reduzirem, em hipótese alguma, a dotação orçamentária destinada à instrução primária na data da celebração dos acordos. Em relação ao ensino secundário: divisão do ensino em dois ciclos, um, fundamental, de quatro anos, e outro, complementar, de três; inclusão no primeiro ciclo do estudo do português, francês, inglês, cálculo aritmético e algébrico, geometria plana, geografia geral, geografia e história do Brasil, desenho; e no segundo, dividido em duas secções, - bacharelato em ciências ou letras -, matemática, história geral, elementos de física, química e história natural, latim, grego, italiano ou alemão (a escolha), literatura e lógica; faculdade de matricularem-se nos institutos técnicos aos que concluíssem o primeiro ciclo de estudos e de concorrerem ao exame de admissão nos cursos superiores aos que tivessem diploma do segundo; idade mínima de dez anos para matrícula no primeiro ano do curso fundamental; desdobramento de turmas; exames de promoção pela média das notas e das provas parciais feitas durante o ano; revisão cuidadosa dos programas, evitando-se no primeiro ciclo as sobrecargas inúteis e imprimindo-se ao ensino feição prática, com conhecimentos gerais e magistério como condições preferenciais para a investidura no professorado; o concurso de provas, em regra uma burla, seria meio subsidiário para aferir a capacidade dos candidatos; nomeação dos professores por certo número de anos, só lhes sendo concedida a vitaliciedade depois da recondução; disponibilidade dos professores quando completassem 25 anos de magistério ou 65 de idade; equiparação de institutos de ensino limitada aos que fossem fundados e custeados pelos Estados e pelo Distrito Federal. No concernente ao ensino superior, reconhecia as vantagens e os defeitos do Código de Ensino, lamentando que as interpretações cavilosas o houvessem tornado imprestável antes de ser aproveitáveis, uma melhor divisão dos cursos, a docência livre, o exame vestibular, a limitação de matriculas, o alargamento da autonomia das congregações, outras medidas a consubstanciar em regulamentos ou regimentos internos. (LYRA, 1943a, pág. 6-7). 

Propunha, como fecho da reforma, duas criações novas: a da Junta ou Conselho Superior do Ensino e a do serviço de fiscalização permanente deste por um órgão especializado. A primeira, sob a presidência do Ministro da Justiça e Negócios Interiores, centralizaria o estudo de todos os assuntos referentes ao ensino, com audiência obrigatória em alguns casos e atribuições consultivas ou deliberativas em outros; a segunda viria substituir o regime de favoritismo já condenado da nomeação de fiscais junto a determinados institutos.

Para Tavares de Lyra o de que precisávamos era de um corpo de funcionários, – inspetores, delegados e auxiliares –, independentes e idôneos, com preparo técnico comprovado perante a Junta ou Conselho e direitos e deveres expressamente definidos.

Em 1907, ele elabora um projeto de reforma do ensino por entender que a educação deveria ser abordada sob múltiplas faces. Naquela época, o país mudava economicamente do modelo agrário para o industrial e era necessário capacitar mão de obra, o que também motivou o presidente Afonso Pena encaminhar o projeto para discussão e apreciação pelo Congresso Nacional. 

Em longa exposição à Câmara dos Deputados, Lyra advogava em prol da intervenção da União no ensino primário, ponderando que a reforma que se fazia fundamental no momento era a da instrução pública. Para tal, considerava como primeira questão a ser resolvida: a competência da União para legislar sobre o ensino. No mesmo ano, Teixeira Brandão, em nome da Comissão de Instrução Pública, apresentou à Câmara um projeto de reforma da instrução pública, formulado com base na exposição do ministro do Interior. Ao dizer que a reforma do ensino público é uma necessidade consensual que vem sendo proclamada, desde a Câmara até a opinião pública, como fundamental aos destinos da nacionalidade, chama atenção para a complexidade da questão em face ao texto constitucional. Atendendo ao texto, a reforma advoga em prol da intervenção indireta da União por meio de acordo com os governos locais. (MACHADO; SCHELBAUER, 2003, pág. 4-5).

No sentido de modernizar o país, os políticos brasileiros acreditavam que deveria investir na educação do povo, assim como haviam feito outros países, como a Alemanha, a Prússia e os Estados Unidos da América (MACHADO; SCHELBAUER, 2003).

A Proclamação da República possibilitou o desenvolvimento da indústria no país, mas o sistema educacional continuou com poucas iniciativas que pusessem em prática os projetos político-educacionais (NAGLE, 1976). Para se chegar aos fundamentos dos projetos apresentados, coloca-se como fundamental vencer a ignorância e o analfabetismo da maioria da população brasileira por meio da educação (AZEVEDO, 1971).

A educação das massas populares como solução para os problemas do país envolvia várias direções, cabendo ao Estado as devidas providências político-pedagógicas de organização e regulamentação (NISKIER, 1989; SAVIANI, 2000; 2004). Para Nagle:

Uma das maneiras mais diretas de situar a questão consiste em afirmar que o mais manifesto resultado das transformações sociais mencionadas foi o aparecimento de inusitado entusiasmo pela escolarização e de marcante otimismo pedagógico: de um lado, existe a crença de que, pela multiplicação das instituições escolares, da disseminação da educação popular, será possível incorporar grandes camadas da população na senda do progresso nacional, e colocar o Brasil no caminho das grandes nações do mundo; de outro lado, existe a crença de que determinadas formulações doutrinárias sobre a escolarização indicam o caminho para a verdadeira formação do novo homem brasileiro [...] (NAGLE, 1976, pág. 99-100).

As questões referentes ao papel do Estado no financiamento da educação primária ocupam lugar de destaque neste texto. Para Tavares de Lyra (BRASIL, 1918), era necessário que o Estado financiasse a educação, sobretudo, a educação primária. O Ministro cita, em sua exposição, a interpretação de João Barbalho (comentador da lei), que afirmava não ser a instrução pública uma prioridade do Estado. Este ocupar-se-ia apenas do incentivo à iniciativa privada e supriria as possíveis carências, voltando-se mais à criação de institutos técnicos de preparo para o serviço militar. Araripe Júnior (BRASIL 1918) por sua vez, era contrário a essa idéia e, ao comentar a lei, afirmava que ela dava poder à União no que dizia respeito à instrução primária nos Estados, desde que houvesse respeito às leis ali vigentes.
Segundo Tavares de Lyra (BRASIL, 1918), nos Estados Unidos a instrução primária se difundiu rapidamente, apesar da pouca intervenção da União, indicando que, ali, os Estados dispensavam uma ação central mais efetiva. Os americanos, segundo ele, investiram com tal afinco na educação, especialmente após a chegada dos imigrantes, que, diferentemente do Brasil, já contavam com um regime de escolas públicas sólido no início do século XX.

No Brasil, entretanto, a população era pequena em relação ao território e não havia diversidade religiosa, somando-se ao fato de que os Estados e municípios não dispunham de condições para financiar escolas, o que exigia uma maior interferência por parte da União (BRASIL, 1918).
Possuindo um vasto território com pouca densidade de população, ainda nas regiões mais cultivadas, não tivemos e não temos nem a variedade de confissões religiosas, nem a iniciativa particular – que foram ali elementos poderosos da difusão do ensino – para entrarem em concorrência com os Estados e com as municipalidades – que, em geral, não dispõem de rendas para o custeio de escolas na proporção das necessidades do país – oferecendo os seus esforços e recursos pecuniários para a obra da educação do povo, e daí a obrigação que decorre para a união de não deixar inertes as faculdades de que foi investida no art. 35, n. 2, da Constituição da República (BRASIL, 1918, p. 5).

Para Hilsdorf (2006, pág. 58), além das transformações pelas quais passava o país naquele momento, pode-se destacar alguns fatores relevantes que exerceram influência sobre o pensamento e o discurso dos intelectuais e políticos brasileiros da época, como a presença do capital estrangeiro –inicialmente o inglês e, depois, o americano – tendo como conseqüência uma "aproximação a Washington" nos campos da cultura e da política.

A circulação de novas idéias também possibilitava o contato com outras doutrinas e correntes de pensamento, como o positivismo, o industrialismo cosmopolita e o ruralismo. Para Nagle:
É diante desse quadro de transformações – tanto no nível dos setores econômico, político e social, quanto no nível do setor cultural – que se deve analisar a escolarização, nas suas variadas facetas; em outras palavras, com essa apresentação construiu-se o necessário ‘vestíbulo’ para a análise desse processo, pois foram apontadas as interrogações mais significativas. Dessa forma, a escolarização é tida como um dos elementos do subsistema cultural; portanto, um elemento que deve ser analisado e julgado em combinação com os demais elementos da cultura brasileira, e com as condições da existência social definidas na exposição dos setores político, econômico e social. Aceitando-se a idéia de que a sociedade brasileira do tempo passa de um a ‘sociedade fechada’ para uma "sociedade aberta", torna-se necessário identificar o papel que a escolarização desempenhou, no sentido de favorecer ou dificultar a passagem [...] (NAGLE, 1976, pág. 99).

De certa forma, as discussões dos parlamentares refletem bem as divergências do período. Entretanto, havia entre eles um consenso em relação à importância da instrução para um país republicano adepto do sufrágio universal. Ora, se o voto constitui-se em um direito de todo cidadão alfabetizado, como democratizá-lo em uma nação repleta de analfabetos?

Em 11 de setembro de 1907, o projeto é exposto à consideração da Câmara pelo deputado José Carlos Teixeira Brandão, presidente da Comissão de Instrução, que afirmou ser a reforma uma medida urgente para solucionar o problema do analfabetismo no país (BRASIL, 1918). Para esse deputado, todas as nações desenvolvidas procuravam permitir uma maior intervenção da União nas questões relacionadas ao ensino. A própria Constituição do Brasil de 1891 atribuía ao município a instrução primária, ao Estado a secundária e à União e aos Estados a secundária e superior, não impedindo, entretanto, que se fizessem intervenções necessárias, desde que respeitados os governos locais e suas respectivas legislaturas. Essa medida, segundo ele, legitimaria a soberania da jovem República (BRASIL,1918).

José Carlos Teixeira Brandão acreditava que o Estado não doutrinaria os governos locais ao interferir no ensino público. Afirmou que a Câmara dos Deputados assinalara as principais reivindicações do Ministro, sem ater-se aos detalhes para não atrasar a reforma do ensino. Assim, elaborou o projeto, composto de três artigos, que objetivavam responsabilizar o Governo pela reforma do ensino secundário e superior e pela promoção e difusão do ensino primário, levando em consideração todas as necessidades detectadas por Tavares Lyra quanto à interferência da União nos governos estaduais e municipais; formação, seleção e tempo de trabalho dos professores; equiparação dos colégios públicos; contratação de delegados; subvenção das escolas particulares; organização das disciplinas; admissão no ensino superior; instituição da livre docência; criação do Conselho de Instrução; extinção dos exames parcelados, dentre outros (BRASIL, 1918).

Os membros da Comissão assinaram e fizeram algumas observações sobre o projeto, elogiando-o, em particular, pela autorização dada ao Governo para difundir o ensino primário, condição imprescindível para que o país alcançasse o ''progresso" dos países modernos. Além disso, enalteceram os estudiosos do ensino, que analisaram o problema com afinco (BRASIL, 1918).

Para eles, a República não poderia mais adiar a reforma depois do projeto, que reunia as principais necessidades educacionais do país e, por esse motivo, esperavam que não surgissem problemas que pudessem impedir sua concretização, já que desestimularia aqueles que ainda acreditavam na lei (BRASIL, 1918, p. 17).

A instrução primária é reconhecida pelos membros da Câmara como a base de todo o progresso dos povos (BRASIL, 1918, pág. 29). Para eles, ela constituía-se em uma questão social que preocupava todos os países civilizados e envolvia governantes ou até meros interessados, formando uma boa bibliografia sobre o tema e provando que a Europa tinha aderido ao movimento de difusão do ensino primário. A América, no entanto, não demonstrava muita preocupação com a educação do povo, porque enquanto o século XIX na Europa havia sido denominado de "século da instrução primária", o Brasil, formado em sua maioria por ex-escravos e imigrantes, não se atentava para o problema:

Nós brasileiros, que contamos uma população formada de elementos saídos da ignorância das senzalas e dos viciosos e desgraçados costumes das fazendas do sul e dos engenhos do norte, ali mesclados por laivos de uma imigração trazida a granel e sem escolha, nos devemos compenetrar da necessidade absoluta, imperiosa, de erguer as camadas populares, que se vão formando, da ignorância degradante em que se debatem (BRASIL, 1918, pág. 30).

Para a Comissão de Instrução, nem o fim da escravidão, a Proclamação da República e a organização dos Estados em federações fizeram avançar o ensino no Brasil. 

Com base na Constituição, os governos estaduais fecharam muitas escolas primárias, entendendo que estas deveriam ficar a cargo dos municípios. Houve uma má interpretação da lei e os municípios pobres tiveram que resolver o problema como podiam, com escolas distantes, diretores incompetentes e professores mal pagos, provando que aquilo que funciona em um país como os Estados Unidos, nem sempre funcionará em outro (BRASIL, 1918).

Os municípios, segundo os membros da Comissão, deveriam ter autonomia, mas não estavam preparados para resolver um problema que estava além de sua capacidade administrativa, visto que os prejuízos à educação popular e aos direitos privados e sociais eram incalculáveis. O Brasil precisava defender a democracia e a autonomia municipal, porém nunca esquecer de que seus municípios não eram tão ricos como os americanos e europeus (BRASIL, 1918). Os parlamentares acreditavam, em sua maioria, que se a instrução primária interessava aos municípios, muito mais interessaria aos Estados, que poderiam fazê-la progredir.

Não compreendemos como, em respeito à independência dos municípios e com receio de ferir-se-lhes as prerrogativas e liberdades, se lhes outorga a instrução primaria, abstendo-se completamente os Estados de toda e qualquer ingerência em tão importante assunto, que, si interessa aos municípios, também interessa e muito mais aos Estados, que podem dar-lhe mais desenvolvimento e impulso, por isso mesmo que dispõem de mais copiosos recursos e tem mais larga esfera de ação (BRASIL,1918, pág. 33).

A fim de comprovar sua afirmativa, os deputados citam o exemplo da Bélgica que, após a Revolução de 1830, entregou sua instrução primária às comunas e a situação ficou caótica, levando a maioria dos professores a procurar outra fonte de renda, até que o poder central decidiu intervir (BRASIL, 1918). A Alemanha e os Estados Unidos, por apoiarem suas municipalidades para que estas pudessem exercer sua autonomia, levaram o título de “país onde a instrução popular moderna é melhor aplicada e difundida”, demonstrando que, apesar de não haver ali um governo único, havia entre eles um sentimento de unidade (BRASIL,1918).

Na verdade, os intelectuais acreditavam que a educação americana se diferenciava,porque preparava para a ação e a independência, enquanto a brasileira educava para a obediência e a disciplina. Discutiam o problema da França que, apesar de muito falar sobre instrução pública, não priorizava a arte, a literatura e as ciências e contava com um grande número de analfabetos. “Ora, se os franceses tanto discutiam educação e não tinham colhido os frutos desejados, o que seria, então, do Brasil, que sofria a falta de professores, prédios, programas e métodos adequados?” (BRASIL, 1918, pág. 35).

Os membros da Comissão de Instrução acreditavam ser imprescindível que a instrução primária se tornasse obrigatória. Para eles, a fraqueza dos governantes atrasava o desenvolvimento da nação e a preparação do povo para a prática da democracia.

Pretender, acastelado nos princípios da democracia e nos conceitos da liberdade individual, combater a obrigatoriedade do ensino primário, é defender a ignorância das massas, que tantos males acarreta, prejudicando-lhes o bem estar futuro, o progresso do país e o seu desenvolvimento; é dizer ao povo: vós não compreendeis as vantagens da educação, tendes natural aversão à escola, por isso mesmo que não lhe medis o alcance; pois bem, não vades à escola, por que sois livres, porque sois cidadãos, porque ninguém poderá obrigar-vos a frequentá-la; permanecei ignorantes e estais no vosso direito! (BRASIL, 1918, pág. 37).

Assim, a Comissão defendia que a imposição era necessária mesmo em governos democráticos, para que a sociedade não corresse o risco de cair em desordem, ou seja, numa situação de conflito social. Portanto, se os pais não compreendiam a importância da instrução, o Estado deveria ter o direito de obrigá-los a enviar os filhos à escola, evitando a vagabundagem, a ignorância e o trabalho precoce (BRASIL, 1918, pág. 41).

Se o pai não educa os filhos, se não compreende as vantagens da instrução Elementar, dos conhecimentos que escola proporciona para serem bons cidadãos e homens uteis, o Governo que os arranque da indolência para os mandar às aulas públicas.

No entanto, discutia-se também o problema dos recursos financeiros necessários para manter uma criança na escola, uma vez que a obrigatoriedade exigiria do Governo a responsabilidade com as despesas de manutenção e funcionamento, além da garantia do acesso e permanência dos alunos provenientes de famílias mais carentes. Manter a escola pública era um desafio que o país tinha que encarar para fazer frente às necessidades que surgiram com a Proclamação da República. (BRASIL, 1918).

Se o Estado decreta a obrigatoriedade, se pais e tutores são obrigados, sob penas estabelecidas, a mandar os filhos, tutelados e protegidos à escola, quando eles não dispõem de recursos, o Governo tem o dever de atender-lhes às necessidades, fornecendo ás crianças a roupa e os livros de que carecem para as aulas. A obrigatoriedade traz, como consequencia, a escola gratuita, além de outros encargos (BRASIL, 1918, pág. 43).

A instrução pública no Brasil, segundo os parlamentares, não havia sido organizada de acordo com a pedagogia moderna; apenas copiava idéias estrangeiras de difícil execução e desprezava bons projetos por divergências políticas (BRASIL, 1918). Rui Barbosa já afirmara, em 1882, que nosso ensino era decadente, atrasado e vergonhoso e que a reforma fazia-se urgente (BRASIL, 1918).

Porém a maior parte dos deputados concordava com o fato de que o Brasil não poderia espelhar-se em outros países para concretizar seus planos, já que a educação deveria formar o cidadão apto para viver aqui e, por esse motivo, achava-se desnecessário sobrecarregar as crianças com disciplinas abstratas e "fúteis", tendo em vista que a maioria delas passaria poucos anos na escola.

Não compreendemos que nos programas de aulas elementares, destinadas a dar ao nosso povo a educação de que ele carece para desenvolver o seu espírito, aguçando-lhe a observação, tornando-o apto á vida moderna, se façam outras exigências que não estas: lições de coisas, leitura e escrita de nossa língua, explicando e exemplificando o professor os factos principais e correntes de nossa gramática; ginástica; operações numéricas necessárias á vida comum; ligeiras noções de geografia e historia do Brasil; cosmografia; desenho e canto, devendo contar-se a Constituição da República entre os livros didáticos (BRASIL, 1918, pág. 45).

Para Veríssimo (1985, pág. 57), “[...] uma educação para ser nacional precisa que a inspire o sentimento da Pátria e que a dirija um fim patriótico”. Assim sendo, era necessário adequar o ensino público às características brasileiras, sem menosprezar os preceitos da pedagogia moderna, tão estimados nos países desenvolvidos.

A criança educada no Brasil deveria aprender tão logo o amor e o respeito à Pátria e suas energias deveriam ser canalizadas para o serviço e dedicação ao país. Para tanto, primeiramente, as crianças deveriam ser estimuladas a vencer a apatia natural dos brasileiros, que, segundo o mesmo autor, constituía-se em uma herança cultural a ser superada. Veríssimo (1985) acreditava que a brincadeira poderia contribuir nesse aspecto, à medida que possibilitava o desenvolvimento da vontade desde os primeiros anos de vida.

Quando a criança, porém, for apática, indolente, cumpre desenvolver-lhe a vontade, a qual não é senão uma maneira de ser da energia, incitando-a e procurando desafiar nela o sentimento do brio, da dignidade e da honra. Ela não quer brincar, incitai-a a brincar, mostrai-lhe as outras que brincam, brincai com ela, fazei-lhe sentir o atrativo dos brinquedos, arrastai-a brandamente e persuasivamente a brincar.

Na escola, as lições de coisas deveriam ser explicadas de acordo com a capacidade de compreensão das crianças; os objetos deveriam ser familiares a elas e o professor procuraria ultrapassar o conhecimento cotidiano dos alunos. A leitura da Constituição faria com que as crianças conhecessem seus direitos e deveres e adquirissem amor à Pátria, sem o qual um povo, segundo os parlamentares, torna-se indiferente e escravo (BRASIL, 1918).

Os deputados defendiam que a escola é capaz d e deixar fortes impressões nos indivíduos e, por esse motivo, seu dever seria educá-los de acordo com a Constituição do país e, assim, formar bons cidadãos capazes de exercer a democracia. Para tanto, o Brasil deveria preparar professores aptos e capazes d e estimular a curiosidade natural das crianças, sem exigir lições decoradas e conhecimentos sem utilidade prática (BRASIL, 1918).

Em relação a questões de ordem pedagógica, pode-se afirmar que os parlamentares, de um modo geral, concordavam com os preceitos da pedagogia moderna e com a necessidade de adequar o ensino às novas necessidades do país. No entanto, o problema da intervenção da União na instrução primária dividia a Câmara e causava polêmica. O deputado Affonso Costa (BRASIL, 1918), por exemplo, afirmava ser a instrução primária um negócio público e, por isso, um problema de toda a Nação. Para ele, em governos aristocráticos, o ensino elementar pode até ser abandonado, mas em um regime democrático, que exige do povo saber ler e escrever, o Estado não pode omitir-se.

O deputado Affonso Costa cita o Estado de São Paulo como o maior investidor em educação da época e que, mesmo assim, conseguia manter poucas crianças em escolas públicas. Sua afirmativa confirmava a defesa de que a União deveria intervir na instrução primária de todos os Estados, sobretudo dos mais carentes.

No entanto, o nosso atraso é tão grande em matéria de instrução primaria, que no próprio Estado de São Paulo, onde o Governo despende quantia fabulosa com a manutenção de escolas primárias, a infância só frequenta as aulas públicas na proporção de 2% da população! Se nesse Estado, cuja maior glória é derramar as mãos cheias a instrução, a infância apenas na proporção de 2% frequenta as escolas primarias, que poderemos dizer dos outros Estados, onde, pelo apoucado de suas rendas, a instrução primaria é tão parca, tão escassamente distribuída? (BRASIL, 1918, pág. 155).

O mesmo deputado afirmava que a intervenção poderia ser direta, mediante a criação de escolas primárias nos Estados. Acreditava que a medida não prejudicava os Estados, desde que as crianças não fossem obrigadas a freqüentar escolas federais, em prejuízo das estaduais. Porém, sua idéia gerava muitas contestações pelo fato de alguns parlamentares considerarem-na inconstitucional. A estes, o referido parlamentar dirigiu a seguinte afirmação:

Está individualmente convencido de que, de acordo com a Constituição, sem ofensa aos direitos dos Estados, a União pode criar escolas primárias suas nas diferentes cidades e, com maioria de razão, pode subvencionar escolas dessa natureza. Bem se vê que na própria Republica Norte Americana, nos Estados Unidos, não são peregrinas estas ideias, esta doutrina da intervenção e que, se a União não legisla diretamente, não deixa de subvencionar por modo indireto a iniciativa particular, tão eficaz naquele país (BRASIL, 1918, pág. 158).

O deputado carioca José Carlos Teixeira Brandão (BRASIL, 1918), mediante às críticas voltadas ao projeto, pronunciou-se em defesa do mesmo. Para ele, ao estabelecer o sufrágio universal, o país criara a necessidade de erradicar o analfabetismo. Portanto, apesar das deficiências, a Comissão de Instrução procurava, segundo ele, estabelecer um acordo entre União e Estados em relação ao ensino público.

Não é possível, na situação em que nos achamos, com a Constituição que nós adoptamos, estabelecer uma reforma do ensino integral. Entretanto, os encargos do regime republicano, estabelecendo o sufrágio universal, mostram a necessidade palpitante que tem todos os cidadãos de saber ler, de conhecer os direitos e os deveres que lhes assistem, por isso que são chamados como fazendo parte da soberania popular para eleger as pessoas a quem se devem incumbir altos cargos administrativos. Por outro lado, as dificuldades que nós sabem os existem em grande numero, relativas à impossibilidade material do poder central pro ver as necessidades do ensino público em todo o país, nos levaram a aceitar uma ideia já consignada no orçamento passado, autorizando o Governo a entrar em acordo com os Governos dos Estados, visto que, como há pouco disse, o Governo central não pode entrar no território dos Estados para criar escolas (BRASIL, 1918, pág. 233).

José Carlos Teixeira Brandão (BRASIL, 1918) afirmava que o regime republicano exigia uma educação social que libertasse o indivíduo da necessidade da ação do Estado, mas isso se daria de forma gradativa. Acreditava que o espírito do projeto era nobre, porque se resumia em procurar desenvolver o raciocínio do jovem brasileiro para que se tornasse um cidadão melhor.

José Bonifácio de Andrada e Silva, deputado por Minas Gerais (BRASIL, 1918) elogiou o acordo entre União e Estados proposto pelo projeto. Segundo ele, a Comissão afastou o pretexto da inconstitucionalidade da intervenção e, assim, procurou proporcionar ao povo os requisitos necessários à sua participação política. Virgílio de Lemos, por sua vez, criticou o acordo por acreditar que o projeto criava com ele dois sistemas de intervenção: a direta e a indireta. A intervenção indireta, entendia, poderia ocasionar diversos males à instrução primária; o auxílio da União à iniciativa privada poderia criar uma espécie de parasitismo do ensino primário.

Três conseqüências poderiam decorrer do projeto: a desmoralização da União, o mercantilismo do ensino primário e a sobrecarga para os cofres da União, sem o resultado esperado à educação popular. Para Lemos (BRASIL, 1918), nem a exposição de motivos do Ministro Tavares Lyra, nem o projeto elaborado pela Comissão possuíam um plano completo e integral de reorganização do ensino público. Acreditava ser preciso analisá-lo minunciosamente antes de aprovar a reforma. Afirmou:

Não me parecem aceitáveis as medidas propostas pela honrada Comissão para debelar a crise, ou antes, para debelar esse crônico e permanente estado mórbido, que é o nosso analfabetismo. Tais medidas se acham exaradas nas seguintes letras do art. 1º do projeto:
a) estabelecer escolas nas colônias civis e militares e nos territórios federais;
b) subsidiar temporariamente escolas fundadas por particulares e por associações;
c) auxiliar as municipalidades e os governos estaduais, mediante acordo com estes, para fundação e manutenção de escolas nas localidades onde não existirem, ou onde, existindo, forem insuficientes para a respectiva população. (BRASIL, 1918, págs. 330-331).

Virgílio de Lemos não admitia que o Brasil copiasse a prática de países como a Inglaterra e os Estados Unidos, onde a iniciativa privada funcionava, visto que, aqui, ela era, na sua opinião, completamente nula. Outra contradição que via no projeto encontrava-se no artigo 1, n. VI, que determinava que o ensino seria leigo e gratuito, sem, contudo, responsabilizar a União por todas as despesas com o ensino primário, deixando a seu cargo apenas o auxílio e a subvenção. Os auxílios prestados pela União às municipalidades e aos Estados poderiam, em sua opinião, fazer com que estes reduzissem seu investimento na instrução primária, sobrecarregando a União. Além disso, Virgílio de Lemos afirmava que alguns governos locais não tinham condições de promover o desenvolvimento e a difusão do ensino, enquanto outros tinham e, mesmo assim, não cumpriam seu dever. (BRASIL, 1918).

Sua proposta era a intervenção direta da União nos territórios federais e estaduais, sob as seguintes condições: para criar escolas nos Estados, a União deveria certificar-se da inexistência de escola pública na localidade beneficiada, da existência comprovada de pelo menos 30 crianças em idade escolar na região e obter a petição assinada pelos pais ou responsáveis. Poderia, ainda, contar com juízes secionais para garantir a execução da lei de modo a evitar o parasitismo e garantir a criação de uma escola brasileira adaptada às condições físicas e econômicas do país (BRASIL, 1918).

Augusto de Freitas deputado pelo estado de Alagoas foi o parlamentar mais contrário ao projeto, por considerá-lo ineficaz para sanar os inúmeros problemas que atingiam a instrução pública brasileira. Em suas extensas discussões com os demais membros da Câmara, não procurava esconder sua antipatia pela obra da Comissão. Afirmava ser o projeto uma “homenagem ao Governo” (BRASIL, 1918, p. 198) e complementava que ele possuía “[...] cousas boas que não eram novas e cousas novas que não eram boas” (BRASIL, 1918, pág. 200).

Disse, é verdade, Sr. Presidente, que o projeto de reforma da instrução é uma farsa, uma burla, uma penácea; não era um remédio eficaz aos males que nos afligem, que ao em vez de sanar esses males, os agrava, amontoando as dificuldades para o dia de amanhã (BRASIL,1918, pág. 354).

O deputado Pedro Moacyr, por sua vez, julgava o projeto inconstitucional, porque submetia as escolas primárias a duas autoridades: federal e estadual ou municipal. Manifestava-se contrário à intervenção da União no ensino primário, visto que, para ele, essa função competia aos Estados, sendo que a única forma admissível de intervenção seria o auxílio ou subsídio e sem a devida fiscalização do Governo Federal (BRASIL, 1918).

Se o professor primário, se todo o aparelho do ensino primário tiver de obedecer a duas direções, a duas autoridades, simultaneamente, o menor mal que pode resultar daí é a completa anarquia no ensino, que precisa de unidade, de homogeneidade (BRASIL, 1918, pág. 382).

Para Manoel Bonfim, deputado paraibano, apesar de a Constituição não ter explicitado devidamente o dever da União em relação ao ensino primário, estava claro que o Governo deveria concorrer para isso, como ocorria nos países considerados civilizados. Propunha que o Governo da União criasse e mantivesse escolas como qualquer particular e sugeria uma emenda que permitisse a criação de escolas normais federais. Propôs também que os Estados onde a renda percapita fosse menor recebessem maior subsídio e que se estabelecesse um acordo para que os Estados não diminuíssem seus investimentos em instrução primária, para que não deixassem o problema inteiramente sob a responsabilidade da União (BRASIL, 1918).

O deputado sergipense Maurício Graccho Cardoso, concordando com Bonfim, esclarecia ser “[...] o ensino a mola real das sociedades que se encaminham aos seus destinos, olhos fitos no porvir, trilhando o presente, sem, contudo, esquecerem os vestígios do passado” (BRASIL, 1918, pág. 415). Em discurso à Câmara, afirmou:

Em verdade, senhores, sem instrução primária, que é o complemento integral da democracia, larga e criteriosamente difundida, o voto livre, pedra angular da igualdade política, será em toda parte o que há sido para nós outros nestes dezoito anos de idas e vindas, de avanços e de recuos: pura ficção, miragem, sofisma! (BRASIL,1918, pág. 417).

Para ele, a obrigatoriedade do ensino seria uma forma eficaz de vencer a ignorância. No entanto, Graciano Neves era contrário a ela, por ser partidário do ensino livre e da liberdade profissional, afirmando que a obrigatoriedade forçava os alunos a se formarem sem vocação, constituindo um proletariado intelectual.

O ensino obrigatório é aquele que estabelece, como um dogma, que ninguém pode espontaneamente estudar; é, pouco mais ou menos, na esfera pedagógica, aquilo que em religião é o dogma católico da mácula original que só pode ser lavada pela graça de Deus. Neste caso, a graça é a do Estado [...] (BRASIL, 1918, pág. 443).

Para o deputado Passos de Miranda, as condições precárias do Brasil em matéria de ensino tornavam necessários os estímulos à iniciativa privada, que deveria caminhar, defendia, ao lado do ensino oficial. 

Há três conceitos em que se dividem as opiniões e os publicitas acerca das funções do Estado no tocante ao ensino: o conceito de um Estado Professor único, impondo ideias e sistemas, repudiado por completo, em nossos dias; o conceito do ensino livre sem ingerência alguma do Estado, que é o ideal pedagógico, mas de impossível aceitação no Brasil, atentas às condições menos seguras do nosso meio social e de nossa raça; e o conceito do ensino livre ao lado do ensino oficial, que é, por enquanto, o que devemos adotar, sem prejuízo da nação e da liberdade. (BRASIL, 1918, pág. 485).

Assim, em meio a divergências e contradições, os parlamentares envolvidos deram continuidade as discussões em relação ao papel do Estado no desenvolvimento e difusão do ensino primário, bem como em relação ao ensino secundário e superior, não enfatizados neste trabalho. Convém mencionar que, ao fim do período analisado, ou seja, de 1907 a 1909, alguns integrantes da Comissão abdicaram do cargo e outros passaram a se ausentar das sessões, o que enfraqueceu o projeto e dificultou as votações das emendas.

Os deputados sentiram-se fatigados com os intermináveis discursos que não encaminhavam a um possível acordo; ao contrário, apenas faziam aumentar as divergências entre os políticos. Dessa forma, em meio a tantos conflitos, o projeto chegou a ser considerado “[...] enjeitado, abandonado, uma verdadeira salada de frutas” (BRASIL, 1918, pág. 548). 

Finalmente, em junho de 1908, a redação final foi aprovada. A Comissão de Instrução emitiu parecer, oferecendo algumas emendas. Contudo , o projeto Tavares Lyra foi arquivado pela Comissão de Finanças dois anos depois. Este projeto, que consagraria, sem divergências essenciais, as ideias por Tavares de Lyra esposadas, teve marcha muito demorada e, chegando, em fins de dezembro, ao Senado, ai ficou sem andamento, em consequência dos dissídios que precederam à crise política que assolou o Brasil em 1909.

Acabou-se assim a reforma que Tavares de Lyra planejara; mas segundo suas palavras, retiradas de um livro inédito: “Dias que passaram”: “malogrou-se sem sacrifício de muitos de seus princípios basilares, pois alguns deles triunfaram em reformas posteriores e ainda agora , – sete lustros decorridos –, é na divisão por que me batera do curso secundário em dois ciclos, – um fundamental e outro complementar –, que se busca solução acertada para o problema do ensino do segundo grau” (LYRA, 1943b, pág. 8).

O mandato ministerial de Tavares de Lyra foi muito visado pela oposição. Ele foi acusado de gastar dinheiro, sem autorização do Congresso e de beneficiar familiares em empregos federais, além de conceder benefícios de toda ordem aos aliados políticos no Rio Grande do Norte. A essas acusações, respondeu em discurso no Senado.

Texto publicado originalmente no site do Instituto Pró-Memória de Macaíba, atualmente reformulado para Instituto José Jorge Maciel, em outubro/2007.

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