Dos 32 filhos de Fabrício Pedroza havidos de seus três casamentos, Maria Terceira da Silva Pedroza (Terceirinha), fruto do primeiro matrimônio do patriarca macaibense, deixou para deleite de sua família (hoje uma fonte para historiadores) um caderno de notas intitulado: “Aos Meus”, no qual traz a baila uma série de esclarecimentos concernentes a história de Macaíba. Trata-se de um depoimento inédito de valor histórico, antropológico e sociológico que nos permite visão e comentário em torno dos aspectos mais interessantes da nossa cidade, naqueles velhos tempos.
Os cadernos foram milagrosamente guardados no acervo da sobrinha-neta, Sophia de Lyra Tavares, no Rio de Janeiro, de onde retirei várias observações sobre a história de Macaíba.
Um dos apontamentos diz respeito ao translado da imagem da padroeira Nossa Senhora da Conceição da comunidade de Guarapes para o povoado da Macaíba. Sabemos que em 1858, Fabrício Gomes Pedroza e sua terceira mulher Luiza Florinda Pedroza, numa cerimônia festiva, lançaram a pedra fundamental para a construção da capela do povoado e prometeram a doação da imagem da Imaculada Conceição da qual eram devotos. Com o crescimento do lugar era preciso alimentar material e espiritualmente o povo que para ali estava de mudança. Os trabalhos da construção do templo prosseguiram lentamente, sempre com o auxilio material de Fabrício Pedroza e família.
Em 1861, Antônio Pessoa de Araújo Tavares, marido de Guilhermina da Silva Pedroza, filha de Fabrício Pedroza, tendo empreendido viagem de negócios a Corte (Rio de Janeiro), trouxe uma imagem de Nossa Senhora da Conceição para sua esposa. O casal estava se preparando para uma temporada em seu engenho “Marotos”, localizado na cidade de Nazaré da Mata, província de Pernambuco, quando Guilhermina mostrou-se preocupada com o fato da capelinha da Macaíba encontrar-se sem um orago.
São notas de Terceirinha: “Acordaram as manas Guilhermina e Feliciana que o vulto da Imaculada Conceição, comprada na corte pelo meu cunhado Antônio Tavares para presentear a Guilhermina, deveria, com o consentimento do nosso pae, ser imediatamente sagrado como orago da capela em construção na Macaíba".
Segundo Terceirinha: “todas as mulheres trabalharam o arranjo da carruagem que transportaria o vulto da Imaculada Conceição, colhendo nos jardins as flores e rosas mais bonitas que comporiam o cenário. Acertamos que vestir-mos-ia o branco e azul, trazendo os adoremus e terços votivos. Todos os cabrioles, tilburis e demais carros foram solicitados e transportaram enorme quantidade de senhoras e senhorinhas amigas nossas, que se irmanaram no propósito firmado por minhas irmãs”.
E os homens? Estes deliberaram a doação dos Santos Cosme e Damião e organizaram um cortejo que partiu do Engenho Jundiaí (também propriedade dos Pedrozas) e encontrariam as mulheres no alto do Ferreiro Torto. Todos elegantemente trajados “de cartola e fraque”, montados em garbosos cavalos de sela, “traziam nos braços fitas azuis e brancas e medalhas da Senhora da Conceição em suas lapelas”.
Um altar com as imagens de Cosme e Damião e da Senhora Santana foi montado previamente na passagem do Ferreiro Torto onde rezavam, aguardando. “misturavam-se os empregados negros e brancos, meninos e jovens, liderados ao passo lento do cavalo de papai e de meus irmãos e cunhados”. Distinguia-se entre outros homens: Antônio Alecrim, Delmiro Carneiro de Mesquita, João Evangelista de Vasconcelos Lima, Vicente de Andrade Lima, Feliciano de Lyra Tavares, Ismael César Duarte Ribeiro, Manoel Modesto Pereira do Lago e Manoel Joaquim Teixeira de Moura.
O Cortejo era guiado por Fabrício Pedroza, os filhos Francisco Pedroza, Inácio e Francisco Pedro Bandeira de Melo Neto; os genros Amaro Barreto Maranhão, Antônio, Francisco e Miguel Tavares e João Juvenal Tinôco.
Ao se encontrarem, as procissões confraternizaram e seguiram pelas ruas de chão batido e com os poucos lampiões existentes, que queimavam azeite de mamona, entoando cânticos de glória e louvor a Nossa Senhora da Conceição, Santos Cosme e Damião. As poucas residências por onde iam passando, estavam enfeitadas com flores e o povo em suas melhores roupas ia se juntando a procissão, contritos de fé e abraçando sua padroeira.
A imagem de Nossa Senhora da Conceição seguiu em uma carruagem de quatro cavalos conduzida por Nhá Maroca, Judite, Mãe Luiza Pedroza, Guilhermina Tavares, Feliciana Maranhão e Ignêz Tinôco, além dos anjinhos Maria da Cruz, Joaquina, Áurea e Luiza Pedroza.
Após a cerimônia e mesmo durante a chegada do préstito houve inúmeras girândolas e músicas tocadas por uma banda vinda de Natal. Organizaram-se várias barraquinhas onde serviam as comidas típicas, algumas hoje quase desconhecidas: os pastéis de carne de porco, o chouriço, os doces secos, os sequilhos, as castanhas de caju confeitadas. Uma enorme mesa foi posta e todos tomaram parte nela, assistindo aos festejos seguintes que durariam até a manhã seguinte.
A festa profana, por esse tempo, era mais viva e reunia todos os folguedos da região. Assim, os homens organizaram corridas de argolinhas e apresentação de pastoril. A autora refere ainda que saíram às ruas o maracatu, o batuque e o Bumba-meu-boi, folguedo da preferência de Fabrício Pedroza.Embora Jundiaí e Guarapes tivessem Nossa Senhora da Conceição como padroeira, esse depoimento apresenta a primeira manifestação religiosa especificamente ligada a festa da padroeira de Macaíba, que em 2011 completará 150 anos.
Emociona-me ler este relato da chegada da imagem da Imaculada nas terras de Macaíba. Todavia, não me furto de invejar esta celebração que dista léguas das festas e procissões da Imaculada Conceição dos nossos dias.
ResponderExcluirHoje a santa é carregada num caminhão, distante do povo que lhe é devoto, distante dos ombros de tantos filhos desejosos por carregar seu andor. E ao invés de serena melodia, pulam ao seu redor meninotes dançarinos e de voz aguda, enlouquecendo nossos tímpanos com melodias por vezes alheias ao respeito que tal ato merece.
Parabéns pelo resgate desta página da nossa história.
Seu amigo e irmão de armas,
Jairo Justino.
AMEI A REPORTAGEM.PARABÉNS.
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