Nascido em Macaíba, na rua do Pernambuquinho em 03 de junho de 1928, é filho do espanhol Jaime Quintas Perez e da potiguar Joana Geraldo Freire. É irmão de Rutênio e de Rossini Perez.
Renard Perez teve uma bela infância em Macaíba, na paisagem pacata e interiorana, a casa assobradada construída em 1931, num grande sítio no Vilar (Rua Heráclio Vilar). O mundo doméstico, o contato com a natureza nos espaços abertos do sítio e arredores os piqueniques com famílias amigas, os banhos na lagoa de Paparí e em São José de Mipibu; as aulas no Grupo Escolar Auta de Souza onde aprendeu a ler e recebeu as primeiras noções de Geografia, História e mesmo Botânica - estas últimas ministradas ao vivo em bucólicas excursões que a escola organizava.
Em 1943, sua família segue para o Ceará, instalando-se em Fortaleza. Naquela cidade, aos quatorze anos Renard desperta para as letras. Num começo de adolescência mais solitária (os dois irmãos mais velhos nos respectivos mundos) a que a vida no colégio não dava a suficiente contrapartida, Rossine enchia o cotidiano com as leituras da idade - as histórias em quadrinhos do Suplemento Juvenil e O Globo Juvenil, o Lobato para crianças, os livros de aventuras da Coleção Terramarear.
Por outro lado, seu pai Jaime Quintas Perez, imigrante espanhol (da Galícia), de formação quase apenas autodidata, era um tremendo leitor - adquiria todas as novidades em literatura de prosa (traduções, sobretudo) que apareciam nas livrarias de Fortaleza - leituras para as quais o moço em breve passava. Meio de evasão que; num caminho a bem dizer natural, desaguaria na própria criação literária - em contos meio aparentados com as histórias que lia.
A certa altura um desses contos, esquecido nas folhas do caderno escolar, foi descoberto por um colega que se entusiasmou com sua leitura e mostrou-o ao irmão marista que era professor de ambos.
Na adolescência, Renard lia os livros que encontrava na estante paterna: de cambulhada, de Blasco lbañez a Romain Rolland (Jean Christophe), passando por Gorki, Steinbeck, Richard Wright, Remarque, Richard Llewellin (Como era verde meu vale), Renné Belbenoit! (A Ilha do Diabo), e ainda Pearl S. Buck, Cronin, Maugham, Zweig, Milton, ao lado de alguns nacionais - Humberto de Campos, Lins do Rego (Riacho Doce), e o Érico Veríssimo da primeira fase.
Foi por essa época que o escritor descobriu a genialidade de Machado de Assis, não na mesma forma dos autores já citados, e nem sequer por livros seus, mas através da Biblioteca Internacional de Obras Célebres - antiga coleção de grandes volumes, que um vizinho começou emprestar-lhe em troca dos livros que lhe apanhava na estante paterna. O primeiro trabalho lido foi O Manuscrito de um Sacristão; o segundo, num novo volume, O Enfermeiro.
Renard Perez seguiu para o Rio de Janeiro, em fins de 1943, foi como a anterior para Fortaleza, conseqüência natural do trabalho paterno. Seu pai viajou duas vezes da Europa para a América em busca de trabalho - a primeira aos 14 anos, indo então para Cuba a chamado de seu avô; a segunda, bem mais tarde, para a Argentina, Uruguai é em seguida Brasil (Nordeste). Em 1920, aos 28 anos, casou-se em Natal, com Joana Geraldo Freire, de São José de Mipibu, passando a residir em Macaíba. Espírito empreendedor conseguiu atingir uma situação estável, de prosperidade (de empreiteiro em serviços de pavimentação e uma incursão paralela no comércio, acabaria como sócio de uma firma de construção civil). Minha vida até o fim da adolescência está assim subordinada à movimentação em função de seu trabalho e à conveniência da vida da família.
Somente no Rio de Janeiro, a partir de 1944, a par do ensino de Literatura no curso colegial é que volto a ter contato com Machado de Assis, e passa a ler toda a obra, agora metodicamente, bem como certos autores encontrados originariamente na Antologia Nacional. Começava, por outro lado, a acompanhar os suplementos literários, travava conhecimento com os modernos (Jorge Amado). Descobriu as Obras primas do Conto Brasileiro, de Edgar Cavalheiro, Mário de Andrade, Marques Rebelo, Aníbal Machado - revelados ali, foram outras grandes aquisições. Conheceu Graciliano Ramos, sobre o qual lera uma resenha - e que o deslumbrou, como antes o fizera Machado. E seriam eles - Machado, Mário, Rebelo e Graciliano - os grandes responsáveis pela direção que Renard iria tomar.
Foi ainda no Rio de Janeiro que Renard Perez avança na seara literária com uma pequena novela: “Quando eu morava no Norte”, publicada em 1945, e em Contos Magazine, seguida em pouco por mais dois contos na Revista da Semana, foram os novos passos nessa apaixonante aventura com que parecia abrir-se ao moço o caminho para o mundo das Letras.
Em fins dos anos 40, inícios dos 50, surgiu um movimento de reivindicação, de parte dos autores novos pela conquista de um espaço nos cadernos literários da grande imprensa, que era perpetuamente ocupados pelos ''veteranos'' - movimento que se estendeu pelo país e que resultou um surto de revistas desses “novos” - no Rio, a Revista Branca. Sensível àquela reivindicação, a escritora Dinah S. de Queiroz, que mantinha em "A Manhã" uma crônica diária sob o titulo de "Café da Manhã", ofereceu esse espaço em determinado dia da semana para uma crônica desses "novos", recebendo o autor quantia correspondente à sua. Assim aparecia, em setembro de 1949, a "Crônica dos Novos", no Café da Manhã" que se prolongaria por um ano e meio, mas já começando a ter, a partir do terceiro mês, uma página dominical no corpo do jornal - espaço em que atuavam, com Renard e uns poucos mais, Fausto Cunha, Samuel Rawet, Luís Canabrava, Jones Rocha, Nataniel Dantas. Movimento ainda que, sem falar no gesto de generosidade que o fez nascer, e no sentido da divulgação, muito valeria no campo de aprendizado no sentido profissional e no do companheirismo.
Foi em 1951, já desfeito o grupo do "Café da Manhã", que Renard Perez publicou seu primeiro livro. Tinha publicado mais quatro contos desde a minha entrada no grupo, um deles classificado num concurso da Revista Branca; um outro citado no "Parecer da comissão Julgadora" constituída por Sérgio Milliet e Antonio Cândido, no concurso de livro no gênero promovido pelo jornal Tentativa, de Atibaia, SP; tinha as crônicas do “Café da Manhã”. Convertera em novela um romance de caráter psicológico em que vinha trabalhando - o drama, em ambiente de pensão, de um estudante envolvido num caso de consciência. Tornou-se O Beco. Foi editado pela Revista Branca, o desenho de capa é de Santa Rosa, numa edição de 500 exemplares. Era abril de 1952.
O livro teve uma crítica razoável, até dezembro sete artigos, o primeiro já na semana de lançamento, assinado por Willy Lewin. De citar, ainda, os de Fábio Lucas, Oswaldino Marques, Fausto Cunha. Essa crítica pode ser definida nestas frases de Samuel Rawet, membro da Comissão que aprovou a publicação: “Das duas partes, a segunda está melhor realizada, com mais densidade emocional e mais contenção de linguagem”; e esta: “Renard Q. Perez deixa-nos, no fim da leitura, uma boa impressão e uma certeza por suas possibilidades de ficcionista”. Fausto, que conhecia os contos do autor ainda recentes, enfatizou essa produção ulterior. O artigo, no Letras e Artes, se intitulava "Renard Q. Perez, um Escritor".
Incursionando pelo jornalismo, Renadr Perez teve um breve período na revista Manchete - sempre jornalismo literário – seja na imprensa e no rádio, aí na condição de funcionário do Estado e atuando na Raquete Pinto. Esteve desde 1953, por trinta e três anos, fazendo nessa rádio programas de caráter cultural.
Na Revista Manchete Renard Perez não ultrapassou os cinco meses. Não se adaptou ao ambiente, à própria função, tendo em vista a natureza das reportagens que lhe cabia fazer (ainda assim, fez sete assinadas). Em todo esse tempo não deixou de colaborar em jornais e publicações literárias - Jornal do Brasil, Paratodos, Jornal de Letras, até que foi chamado por Moacyr Werneck de Castro para a Última Hora, na qualidade de colunista literário. Ficou aí, com seção diária, de abril de 1961 a julho de 1962 - período do qual possui, como o da Revista da Semana, as melhores lembranças. Em 1963, assumiu a chefia-de-redação da Leitura, onde passou dois anos e conseguiu fazer um trabalho de renovação, havendo para lá levado nomes como Otto Maria Carpeaux, Joaquim Cardoso e Marques Rebelo, sangue novo como Heitor Cony e um Fernando Py. Foi sua última experiência no setor.
Na imprensa escrita, a publicação de seu segundo livro, Os Sinos, pelo Jornal de Letras, aproximou-o de José Condé, que organizava a página literário do “Correio da Manhã”. A seu convite Renard fez nela, de 1955 a 1958, uma série de reportagens de caráter biográfico (em número de 64) - Escritores Brasileiros Contemporâneos, parte da qual, com outra posterior, seria reunida em obra de igual título (1ª e 2ª séries, 1960/1965: 2ª ed. rev. 1970/71, Ed. Civ. Bras.).
Ainda em 1958 (agosto) Foi trabalhar, já com carteira profissional, na Revista da Semana, a essa altura em decadência e onde, por abandono de função por parte do novo redator chefe (que lhe convidara), ocupou o lugar até seu fechamento (janeiro de 1959). Sempre interessado na coisa literária e sem fugir do espírito da revista, procurou dar, àquele ambiente, a melhor acolhida. Renard Perez convidou para ali colaborar nomes como Carlos Drummond, Jorge Amado (que voltara há pouco para o Brasil e relançava o Paratodos) e Aníbal M. Machado.
Na obra literária de Renard Perez, os temas dominantes são relativos ao cotidiano, com ênfase no comportamento humano, de elementos da pequena classe média, da gente do povo na sua individualidade. Com seus conflitos (e alegrias). O amor e o desamor. Um íntimo de repente captado; a beleza (ou fealdade) secreta.
Afastado do Nordeste em termos físicos, Natal aparece em sua obra (como Macaíba, Fortaleza) o mais das vezes de forma subjetiva, através de suas vivências aí.
O romancista, novelista e sobretudo contista Renard Quintas Perez reside em Copacabana, onde o visitei em julho de 2010. Sobre a sua concepção de literatura disse: É à maneira de expressão de meu sentimento de ver e viver a vida.
Sobre sua cidade natal afirma: “Nasci em Macaíba e aí vivi até os seis anos, voltando oito anos mais tarde, numas férias. Depois disso, só tornaria a vê-la quatorze anos depois. Procurei, então, meus lugares de infância. E verifiquei, fascinado, que quase tudo se encontrava como no meu tempo.
Assumiu, essa visita, a maior importância para mim. Porque, vendo a cidade como há quatorze, vinte e dois anos, era como se ela restituísse algo que me parecera perdido. Algo que a vida, a cidade grande ameaçavam tirar. Foi como uma volta a mim mesmo.
Desde então, sempre que um cansaço do hoje, uma saudade do passado me chegam, já sei, é tempo de visitar Macaíba. E volto a ela, e encontro os doces cenários amigos. Suas ruas, o rio, o sítio onde me criei, a igreja. As próprias pessoas – me parecem – são as de meu tempo. E novamente acontece o encantamento. Aquela tranqüilidade me aquece, atua reconfortante dentro de mim”.
Sua bibliografia é a seguinte:
O Beco (novela), de 1952;
Os Sinos, de 1954;
Escritores Brasileiros Contemporâneos, 1ª série, de 1960;
O Tombadilho, de 1961;
Escritores Brasileiros Contemporâneos, 2ª série, de 1965;
Começo de caminho: O áspero amor, (romance), de 1967;
Chão Galego, de 1972;
Irmãos da Noite, de 1979;
Trio (conto), de 1983.
bela homenagem ao Renard, um grande escritor e uma pessoa excelente.
ResponderExcluirum abraço,
Antônio Dutra